RIO JUQUERIQUERÊ
À sombra de uma jaqueira
Pedro, Irene e Silvia Paes da ACAJU (Associação Caiçara Juqueriquerê)
Às margens do rio Juqueriquerê haviam inúmeras árvores cujos frutos alimentavam muitos peixes. Árvores de frutos pequenos e grandes. Dentre várias árvores havia uma jaqueira enorme, frondosa que lançava uma grande sombra sobre o rio. Além dela servir para as crianças brincarem de balanço em seus galhos, ela dava jacas deliciosas para os moradores do local. A sua sombra era adorada por peixes que se descansavam sob a mesma. Havia um peixe em especial que vivia à sombra da jaqueira para descansar e para dar botes em outros peixes que por ali se aventuravam. Este peixe era o mero. Era um peixe grande que pesava acima de 150 kg. Ele virou até lenda, pois diziam que em determinada parte do rio ele vivia assustando pescadores e até virava barcos. Era, pois não é mais, pelos menos no rio juqueriquerê ele não entra mais. Sumiu o mero. Sumiu a jaqueira e com ela a sombra, as brincadeiras e os frutos. Perdemos todos.
Nas margens do juqueriquerê tinham uma variedade grande de plantas e árvores nativas que serviam de alimento para animais, peixes e o próprio homem. Hoje, não há mais as árvores. Mas há o assoreamento do rio. A falta das plantas nativas como mata ciliar, está causando erosões. Somente poderá haver um equilíbrio local se houver plantação à beira do rio de plantas nativas. A vegetação de mangue é uma delas.
Onde andam os pés de araçás? As corticeiras cujos frutos eram comidos pelos caranguejos? O cachorro do mato (ariranha)? A aroeira? As palmeiras que alimentavam os pássaros? E a caraguatá existente na boca do rio? O pacová, a erva terrestre, a erva balieira, a dormideira, o ingá, a guanxuma, a paina, a taboa? E os diferentes pássaros? Por onde andam todos? Será que eles estão sob os aterros de concretos que hoje se fixaram às margens do rio? Será que eles navegam nas lanchas luxuosas que andam sobre as águas do juqueriquerê? Que lógica é essa?
O Rio Juqueriquerê[1]
Silvia Regina Paes*
Juqueriquerê significa a “planta que dorme”, por ter uma quantidade grande de uma espécie de planta denominada “dormideira” que, ao encostarmos nela, parece murchar. Uma índia guarani disse também que juqueriquerê significa “água salgada”.
Esse rio nasce da união de dois rios pequenos o rio Claro e o Rio Camburú , ambos nascem na Serra do Mar. A distância aproximada do bairro Rio Claro, onde se forma o rio Juqueriquerê, até o mar, ao longo do bairro Porto Novo, é de 8.055m.(Olavo A. Hummel, 1919:10). Com uma profundidade de aproximadamente 4 a 5 m, e com largura de mais ou menos 30 a 40m.
No entretecer das águas do rio e do mar, ambas se unem, se misturam e se transformam num ponto chamado Boca da Barra. Esta serve como entrada e saída de pescado, de madeiras caídas da Serra, após uma chuva forte ou mesmo um desbarrancamento do rio. A maré vazando leva para o mar tudo o que o rio não pode abrigar. Quando a maré enche, entra no rio pescado à procura de alimento, atrás de outros peixes, e também a procura de um abrigo para desovar. Águas que mudam de cor e sabor num vai e vem de marés cheias e vazantes. A cor muda devido às chuvas que, ao caírem na Serra, trazem para o rio o barro. O sabor varia de acordo com a entrada de água do mar no rio, quando a maré enche, tornando a água do rio salobra.
Segundo relatório de João P. Cardoso (p.55) o rio não foi somente um lugar para a pesca; também foi outrora um espaço bastante importante para a construção da cultura caiçara, em especial para a população que vive no bairro Porto Novo, Barranco alto e Morro do Algodão em Caraguatatuba. Sobre as águas do rio Juqueriquerê adultos e crianças construíam as relações sociais: para as crianças o brincar de nadar com jangadas construídas de troncos de bananeiras; o aprendizado na arte da pesca acontecia às margens e nas águas do rio Juqueriquerê.
[1] Segundo Sampaio (1978:364), Juquiriquerê significa planta dorminhoca ou sensitiva.
* Caiçara da beira do Rio Juqueriquerê, Dra. em Sociologia e Professora da UFVJM/Diamantina-MG.